A cúpula da Sé

A cúpula da Sé

Essa chuva cai ou não? Enquanto espero meu vôo, sofro por ter medo das chuvas de São Paulo. Em dias de vôo, sempre fico apreensiva, mas eu faço tantas vezes esta ponte Vix-SP… não quero mais sentir medo. Sem pensar, esqueço um pouco a cor das nuvens, foco meu olhar nas torres e na cúpula da Catedral da Sé. Um contraste maravilhoso com o céu. Esqueci a chuva, esqueci o medo. Enxerguei uma bexiga e agulha pronta para estourá-la. Pensei no pavor que eu tinha, quando criança, de ouvir estouro de bexiga. Eu tinha medo que na gincana da escola colocassem aquela brincadeira de sentar na bexiga. Eu sofria com o medo. De verdade. Lembrei de quando eu tinha medo de um tornado me levar como levou a Dorothy Oz. Me diverti. Hoje sou capaz de estourar uma bexiga com as mãos e acho que nem fecho os olhos na hora do estouro. Pensei na chuva de novo. Teve uma vez, lá em Budapeste, que uma tempestade chegou do nada enquanto a gente atravessava o rio de barco. Não senti medo. Fiquei tirando foto da nuvem desabando sobre o rio, em nossa direção. Não tinha trovão. Mais uma vez voltei meu olhar e meu pensamento na Sé e no contraste com as nuvens. Que lindo. Ver São Paulo do avião também é lindo. Retomei meu medo da chuva, do avião, a apreensão antes de voar em dias de chuva. Contei nos dedos as vezes que senti medo de voar. Não coube nos dedos. Fiz um corte, um tipo de seleção cronológica. Me dei conta de que quando voava menos, sentia mais medo. Quando comecei a voar mais, meu medo diminuiu. Lembrei do dia que teve uma turbulência tão forte quando descíamos em Guarulhos, que bati com a cabeça e desembarquei segurando um saco com gelo na testa. Não tive medo naquele dia. Nem quando, num vôo para Curitiba, o avião deu uma descida tão brusca, que voou água e amendoim pra todo canto. Olhei mais uma vez para a cúpula da catedral. Fiz uma foto. Uma vontade louca de pegar a torre com os dedos e usar como agulha pra furar a cúpula e ficar vendo ela murchar até desaparecer por entre os prédios. Me dei conta que tenho é lembrança de quando tinha medo de voar. Não tenho mais medo de voar. Nem de estourar bexiga, nem da chuva.