Ele chegou. O tão esperado Natal, o tempo de… De quê mesmo? Vixi… Esqueci ou simplesmente não sei.
Interessada nas festividades- afinal reunir família e amigos para um bom jantar regado a conversas que se embalam e prolongam sob o efeito do álcool- sempre gosto de celebrar o Natal.
Mas no fundo, bem lá no fundo, gosto mesmo é de celebrar a vida. não a vida de Jesus, do Deus Sol ou de qualquer outra coisa rodeada de mistérios que, somados, definiriam o natal que temos hoje. Por isso, o que imposta, pra mim, bem na verdade, é a troca de presentes, a gente sentado no chão, rindo com amigos e avaliando o quanto cada um de nós conhece ao próximo, o que se define a partir dos acertos e erros nos presentes.
Convenhamos, meus caros, que ganhar presente é absolutamente delicioso. Então… VIVA O NATAL!!
Mas o que é este tal de natal?
Minha avaliação, como mãe e pessoa que adora uma festividade, fica, neste ano, por conta do que ouvi do Francisco e do seu melhor amigo, o Mateus. No dia dezesseis de Dezembro, quando abriram o calendário do natal, encontraram o seguinte bilhetinho: ” Natal é tempo de…”. O Mateus respondeu prontamente: “É tempo de inverno’!!!!!!!!!!!!!. O Chico, depois de uns trinta segundos pensando, respondeu; ” É tempo de as pessoas boas fazerem o que sempre fazem e as pessoas más fazerem coisas boas para poderem ganhar presentes”.
Nossa!! Que legado eu e a Poliana estamos deixando pros meninos… Imaginem só os dois, morrendo de calor em Vitória, mas chamando o calor de inverno e, enquanto suam numa épica batalha de BeyBlade, pensam, cada um na sua, se fazem o que sempre fizeram ao longo do ano ou se fazem coisas diferentes para poderem ganhar presente.
No desespero, tentei explicar pra eles que moramos num país cristão e que, assim sendo, seguimos o padrão imposto e acabamos nos envolvendo com as festividades. Mas no meio de uma batalha Bey, quem vai querer saber disto tudo, ou disto nada? Foi em vão, é claro.
Na mesma noite, antes de dormir, o Chico me pediu pra explicar pra ele a tal história do Natal. Pobre coitado, filho de uma mãe cheia de fé e nula de religião. E eu seria uma hipócrita se dissesse a ele que é tudo uma besteira, afinal adoro as festividades, como já disse.
Então começa o discurso: “Filho, tem gente que acredita que Jesus nasceu no dia vinte e cinco de Dezembro, numa manjedoura (sim, o Francisco aprendeu esta palavra na escola!!! A escola laica que responde aos projetos laicos do Estado), num lugar onde faz frio em Dezembro, numa outra cidade que não a dele, porque os pais tinham viajado para pagar impostos (achei melhor não explicar o lance do censo, complicaria demais e ele já sabe o que é imposto). Falei pra ele que Jesus era de uma família pobre e por isto dormiu numa manjedoura, único lugar onde puderam passar a noite depois da viagem no lombo do burro. E que, muito cansada, Maria, a mãe de Jesus, acabou entrando em trabalho de parto. Contei da estrela guia, dos Reis Magos, do anjo que veio do céu…E concluí com um curto, grosso e sincero “mas eu não acredito em nada disto”.
Tadinho… O que fazer se nasceu filho desta mãe? Ou cresce, ou padece…
Me conhecendo, ele aceitou que tem gente que acredita e gente que não acredita. Deu-se por satisfeito e dormiu.
Hoje, oito dias depois do bilhete do calendário e da nossa conversa; e depois de abrir N presentes ontem, ele me trouxe sua teoria sobre esse lance de Natal:
“Mãe, eu gostei muito da noite de Natal. Tem bastante gente que gosta de Jesus, né? E você falou que ele era briguento na hora de resolver as coisas com os romãs (que eu, Laura, imagino serem os romanos- já que o chico chama as veias do corpo de AVEIAS, pode ter feito uma troca similar). E as pessoas boas ficam bravas quando vêem alguém fazendo coisas feias e os Romãs faziam os pobrezinhos viajarem de longe pra pagar dinheiro e eles nem tinham carro!!!! Viajar no burro é ruim mãe, se chove molha a gente. Então Jesus era bom. Por isto que gostam dele. Eu gosto também, porque ele morreu e nasceu de novo. Então ele é bom (Entendam gente!!! o BOM pro chico é sinônimo de BOM PRA CARALHO NO QUE FAZ, não de “bonzinho” com os outros; e, sendo competitivo, o Chico só poderia gostar do Jesus, afinal, quem não gostaria de um cara bom pra caralho?!!). Mas eu acho mãe, que o Deus é mais poderoso que o Jesus. O Jesus é filho dele, né? Qual dia que Deus nasceu?”
Em silêncio até então, só tive tempo de responder “não tem dia certo, filho, Deus existiu sempre, nem tinha dia e noite naquela época”
“Mas, mãe. Você percebeu que o eu acho que o Deus é mais poderoso que o Jesus? (sim filho!). Mas eu acho que na verdade o mais poderoso de todos é o BIG BANG (é, meus caros, o Francisco aprendeu esta expressão com o vô Pedro e, desde então, tem fascínio por pensar numa explosão gigante, enorme, desmedida e poderosa).”
Veio o silêncio… Um comportamento que o Chico mantém, como o meu pai, de conseguir, inexplicavelmente parar no clímax da conversa para pensar e reorganizar seu raciocínio. E neste momento saímos de casa para ir a um velório no Jardim da Paz (um cara que trabalhava com o Gandhi faleceu ontem e o fomos até lá em respeito à família. Chegando lá, o Gandhi foi dar as condolências à família. Eu não conhecia ninguém e saí dar uma volta pelo cemitério com o Chico. E foi neste cenário que ele resolveu concluir o assunto.
“Mãe, o homem morreu no dia que Jesus nasceu”.
“Não filho, ele morreu no dia vinte e quatro e Jesus, dizem, nasceu no dia vinte e cinco”.
“Mas mãe, finalmente eu acho que a gente não devia ficar embaixo da terra depois de morrer. O Jesus era forte, né? Como que ele conseguiu empurrar aquele tanto de terra pra sair e viver de novo?”
(O Chico tava vendo a terra que tinham tirado para colocar o caixão. Pronto, agora sim o Jesus era BOM PRA CARALHO. Além de conseguir viver depois de morrer ele ainda conseguia remover aquele tanto de terra de cima dele!!!).
“Será que tava chovendo quando ele nasceu de novo, mãe? Senão ele ia sair todo cheio de lama.” (agora era o fim…. o Francisco odeia lama, então devia estar pensando que no dia de ele mesmo ressuscitar poderia estar sol!)
“Ah! filho, não sei…”
“Mas, mãe:?! Se na época que o Deus nasceu não tinha dia nem noite, também não tinha que ir pra escola. Deus não ia pra escola. Jesus ia?”
“Não filho, não ia”.
“Mas então o Jesus aprendeu a morrer e nascer de novo sozinho!!!!!!!?”
“Não filho, foi Deus”.
“Mas o deus aprendeu sozinho!!! Ele não ia pra escola; você que disse”.
(Fiquei naquele silêncio de putaqueopariu.)
“Mãe, tem passarinho ali”
(Eba!!!!! Mudou de assunto, agora eu estaria salva!!!!) “Tem mesmo filho, o nome deles é quero-quero” “Eu sei mãe” (com aquele ar de dãããããããã olhando pra mim).
“Mãe, quem fez os passarinhos foi a natureza. E quem fez a natureza foi Deus. E ele nem foi pra escola pra aprender fazer a natureza. Na natureza tem um monte de chuva (bom… no dia de hoje a chuva seria o único exemplo que viria à cabeça dele. quem mora no ES ou assiste o Jornal nacional sabe bem porque), um monte de bichos que a gente nem conhece. Tinham os dragões e os dinossauros, mas eles já morreram (será que o chico já queria que eles ressucitassem também?!). E tem cobra e burro (o pobre burro, que carregou maria grávida de Jesus, ele deveria estar pensando…) e os cachorros e os pinguins.”
“É filho…”
“Ô, mãe, se foi Deus que fez a natureza e a natureza que fez tudo, por que a gente comemora o dia do Jesus e não o dia do Deus?”
“Já falei filho, o Deus não nasceu num dia certo. Naquela época não tinha dia ou noite, nem tinha calendário”
“Mas será que isto não é um segredo que escondem da gente, mãe?”
“Não, filho, pode ficar sossegado. a mãe lê bastante e eu já teria descoberto este segredo se ele existisse”
“Quando foi mesmo que os Romãs mataram o Jesus, mãe?”
“Faz quase dois mil anos, filho”
(e o chico então arregala os olhos, abre a boca, faz uma cara de mega espanto). “ÃÃãã? Tudo isso??!!!!!!“
“É filho, tudo isso”
“Mas então o Jesus nasceu de novo uma vez e depois morreu de velhinho. E o Deus deve ter nascido de novo sempre. Ele sabia nascer de novo porque foi ele que ensinou o Jesus; você que disse. Mas os Romãs esconderam o Deus pra gente achar que eles são poderosos. Mas o Deus não ensinou pra eles como nascer de novo” (hahahaha. Olha o Chico se vingando dos romãs!!)
(agora meu silêncio era definitivo. Melhor calada, né?)
“Né, mãe?“
“É, filho”.
“Mãe, sabe de uma coisa? A gente devia comemorar o dia do BIG BANG. Foi o BIG BANG que inventou tudo. E ele não morre. ele é tudo.”
“É, filho. Boa idéia”
“E se a gente comemora o BIG BANG a gente não precisa ficar comprando presente. Por que a gente ganha presente no Natal?”
“Porque o Baltazar, o Belquior e o outro que não lembro o nome levaram presentes pra Jesus quando ele nasceu”
“Mas eles eram amigos do Jesus? Eles tinham dinheiro pra comprar presente?”
“Não sei filho (essa história não vai acabar????)”
“A gente devia comemorar o BIG BANG e não o Natal. Porque não precisa comprar presente e a gente não precisa jogar aquele saco cheio de papel de presente no lixo. E o lixeiro não precisa trabalhar no Natal. Foi o Deus que inventou os lixeiros, mãe?”
“Não, filho, foram os romanos”
“Os romãs?”
“É, filho, os romanos”
“Os romãs esconderam o Deus, mãe”
“Será, filho?”
“Eu finalmente acho que sim. E eles querem aprender a nascer de novo. E eu também queria, mas só se você também queria” (crianças têm disso, falam de assuntos complicados mas erram na conjugação dos verbos)
“Eu não quero, filho. Viver bastante já me basta”.
“Então eu também não quero. Se eu viver bastante vou poder brincar bastante”
“É isso aí, filho”.
“Mas os romãs querem. Finalmente eu acho que eles que inventaram o Natal. E o Natal é legal, mas o Papai Noel é velhinho e ele fica trabalhando e voando a noite inteira. E o lixeiro também fica trabalhando.”
“É, filho”.
“Mãe, você tem um livro com a história do BIG BANG?”
“A gente pede um pro vô Pedro, filho”.
“Mãe, a gente já andou demais, olha como tá longe o carro”
“É mesmo filho, vamos voltar?”
“Vamos”
(viramos e começamos o caminho de volta. Já estávamos lá no fundo do Jardim da Paz. Assim que tomamos o caminho de volta o chico me deu a mão…).
“Mãe, você é a melhor mãe do mundo”
“Eu também te amo filho”
Eu também te amo, filho
