Desde criança gostei de olhar minha pele, meu corpo. Sonhava em contar todos meus fios de cabelo; mas um dia meu pai segurou nas mãos o lindo rabo de cavalo que eu ostentava e disse “com esse tanto de cabelo dá pra segurar o bondinho do Pão de Açucar”. Desde aquele dia desisti de contar. Passei a me contentar em contar os fios que caem durante o banho. Faço até hoje. Colo um a um no azulejo úmido e depois de contar, começo a fazer formas variadas até embolar tudo antes de jogar no cesto. Na pele conto pintas, manchas, marcas de sol. As vezes olho no espelho e enumero em silêncio as sobreposições – biquini de amarrar, top, regada, camiseta sem manga, gola V, decote canoa, biquini frente única. As pintas dos braços e mãos eu adoro contar e comparar cores, formas e contornos. Brinco também de colorir minhas tatuagens. Adoro variar cores e às vezes, depois que termino de colorir, aproveito para fazer desenhos bobos no braço esquerdo. Faz cócegas. É gostoso. A pele exige delicadeza no traço e firmeza na mão, ou a tinta da caneta não faz o risco. Tem vezes que gosto tanto das cores e dos rabiscos, que protejo para não apagar no banho. Mas eu nunca tinha notado a diferença de cor entre meus braços e minhas pernas. Levei um susto. Descoberta recente. Foi por acaso, sentada à cama, procurando o controle da TV. Passei o olhar e vi o contraste. Achei graça, como se partes diferentes do meu corpo vivessem em lugares diferentes do mundo, com diferentes graus de insolação. Acariciei pele do braço, depois da perna, buscando alguma diferença no toque. Os pelos, as manchas, as pintas. Tudo em contraste. Nunca deixo de passar a mão pela pele. A textura da nossa pele vai mudando com o passar dos anos e eu gosto de perceber isto. Relevos de pintas e rugas. Vincos novos. Como os que vi perto dos olhos estes dias. Eu nunca tinha reparado que tenho rugas no rosto. Sabia das marcas porque sempre me olho no espelho. Não gosto de pensar em um dia me olhar e me achar velha. Então olho bem todos os dias. Olho e gosto. Mas nunca tinha observado os vincos mais fortes. Agora estou criando vínculos com eles. Olhos, boca, testa. Afinal conviveremos até o fim da minha vida.
Meu braço, minha perna
