Ontem comprei um fone novo. Tudo porque, enquanto pedalava, resolvi usar o celular e, enquanto pedalava e teclava, o fone antigo desplugou do ouvido, caiu, enrolou na roda da bike e, claro, crack-creck-prim, se quebrou em varios pedacinhos. Nunca pensei, ao longo da vida até ontem, que aos 44 anos de idade eu usaria fones de ouvido. Nem que os usaria na rua; muito menos enquanto pedalava pela cidade, ouvindo War Pigs. Nem imaginei que usaria a bike como meio de transporte ou que teria pique para fazer isso todos os dias. Depois que comprei o fone novo (com ponteiras cor de rosa, a propósito😊), voltei pra casa pedalando contra o vento, ouvindo Jorge Drexler e pensando, oras… na vida. A gente faz tantos planos. Eu fiz. Me perdi no meio da maioria deles. E seria uma enorme frustração, não fossem essas coisas pequenas da rotina que surpreendem simplesmente porque aconteceram sem nenhum plano prévio. Essas coisinhas que, quando nos damos conta, já são parte da gente. É tão clichê dizer que o que vale é a caminhada, mais que as conquistas. Mas o clichê tem lá seu encanto quando a gente sente, de verdade, seu significado. Mais que as rugas no colo e a pele do rosto toda manchada (apesar do boné e do protetor), a bicicleta me apresentou uma outra velocidade pra viver a rotina. Hoje essa velocidade me inspira para muitas coisas, das fotos que gosto de tirar até observar as pessoas que cruzo pela ciclovia morrendo sob o sol como eu, ao meio dia, num fevereiro em que Vitória está mais perto do Sol que Vênus. Ontem, no sol do meio dia, quando me dei conta estava com mais dois ciclistas parada sob uma arvore enorme. Os três olhando um gavião ensinando seus filhotes a voar entre um poste e outro, sobre a areia da praia. Atrás de nós, centenas de carros, parados em filas obedientes, buzinando ostensivamente. Pensei “não nasci pra isso”, mas logo voltei o foco para os gaviões, afinal eu nasci pra andar de bike na minha velocidade e eu estava era de bike, não presa dentro do carro. Até me esqueci do calor.
Não nasci para isto
