Quando decidi ir embora para São Paulo, não tinha idéia de como seria o processo. Uma emoção peculiar pra mim. Hoje me vi como se estivesse numa intersecção do passado com o futuro. Eu, que sempre me esforcei para viver o presente, estou num vácuo do tempo, vendo minha vida em Vitória como passado e a de São Paulo como futuro. A ansiedade sempre fez de mim uma pessoa sem lugar, sem um canto pra deitar e relaxar. Nunca consegui me colocar no presente de fato. Meus pensamentos sempre são muitos e intensos e persistentes. Depois de muito treino e persistência, aos poucos fui me encaixando no presente; mas tipo passarinho, que para por alguns segundos e já sai voando. Mas este pouco já foi o suficiente pra me fazer entender a beleza do agora. E hoje, aqui nesta lida de caixa, poeira, paredes descascadas, pedaços de bilhetes de amor comidos por traças, cobertores ensacados, álbuns de fotografia, panelas de barro, me peguei de fato no vácuo. Uma montanha de coisas que preciso decidir entre colocá-las na mala ou deixá-las pra trás. E eis que neste hiato enxergo o presente. Sinto isto, o presente como o vácuo entre passado e futuro. Espaço e tempo inertes, como se eu estivesse sem pressa nenhuma para tomar decisões que em nada vão interferir na minha vida prática. Se um meteorito caísse no caminhão da mudança, em nada mudaria minha vida. Se eu perder meus álbuns de foto, isto em nada muda na minha vida. Se eu deixar as panelas de barro para a Laila usar nos bons anos que vai viver aqui neste apartamento, as panelas não vão me fazer falta e, de prêmio, vão criar memórias e comidas deliciosas. Uma boa experiência este presente que estou vivendo nestes dias. Me perguntei tantas coisas e não soube responder nenhuma. Uma sensação nova esta de não saber escolher, entre estas coisinhas empoeiradas, o que levar e o que deixar. Sinto que a sensação de leveza e infinito que está em mim neste momento diz exatamente disto: independente das minhas escolhas, eu não tenho como prever qual será a melhor. A eterna leveza e beleza da vida pode ser esta, a de aceitar que nunca vamos saber o efeito das nossas escolhas. Memórias não ficam para trás. Nunca.
Sensação estranha
