Uma troca de calmas

Uma troca de calmas

Quando minha sobrinha Isabela nasceu, minha irmã teve uma espécie de crise de ansiedade no quarto do hospital e começou a se debater na cama. Minha tia imediatamente começou a fazer carinho no cabelo dela para que acalmasse. Pediu que eu pegasse uma escova de cabelos na bolsa e pôs-se a pentear os cabelos da minha irmã até que ela caísse no sono. Algo que não demorou a acontecer. Nunca entendi bem porque minha tia levava uma escova de cabelos na bolsa. Não uso bolsa e costumo sair de casa munida apenas de mim. Costumava levar um documento e dinheiro comigo. Depois documento e um cartão de crédito. Hoje me acompanha apenas o celular, que carrega dentro dele o cartão, os documentos, uma câmera fotográfica com a qual costumo registrar momentos delicados, cenas insólitas e implicâncias para depois compartilhar nas minhas redes sociais, que também estão embutidas no celular. Portanto, continuo não carregando nem bolsa, nem escova de cabelos. Mas carrego fotos de cabelos. Muitas. Minhas, do meu filho. Sempre fotografo o cabelo dele nos momentos em que paro para penteá-lo e acarinhá-lo. Meu pai costumava mexer no meu cabelo. Ele gostava de mexer em cabelos longos. Corria as mãos por todo o comprimento dos fios. Tenho em mim a sensação das mãos mornas dele encostando na minha cabeça e deslizando até a ponta. Ontem minha prima me disse “que saudade que eu tenho das conversas dele e de ele trançando meu cabelo”. Me veio à memória eu com as amigas conversando à mesa e ele chegando com sua voz grossa, chamando cada uma pelos apelidos que criava para elas e dando uma mexida no cabelo de alguém. Mexer no cabelo do outro é uma intimidade tão delicada. E é gostoso para quem faz e quem recebe o afago. Uma troca de calmas. Um movimento respeitoso. Não passo um dia sequer sem mexer no cabelo do meu filho. Quando ele não morar mais na mesma casa que eu, vou sentir falta do silêncio e da intimidade desse cafuné.